"Alegre-se! Tudo é de todos!"

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

vivências


Murray Bookchin

(Setembro 9 de 1984)


HISTORICAMENTE, a teoria e a prática social radical centraram-se sobre as duas zonas da actividade social humana: o lugar de trabalho e a comunidade.


A partir da criação da Nação-Estado e da Revolução Industrial, a economia foi adquirindo uma posição predominante sobre a comunidade –– não só na ideologia capitalista, senão também nos diferentes socialismos, libertários e autoritários, que foram aparecendo no último século.


Esta mudança de posição do socialismo de uma postura ética a uma econômica é um problema de enormes proporções que teve ampla discusão.


O que é mais importante dentro deste ponto são os socialismos em si, com os seus preocupantes atributos burgueses, estranhamente adquiridos, um desenvolvimento principalmente revelado pola visão marxista de chegar à emancipação humana através do domínio da natureza.


Um projecto histórico que presumivelmente estabelece a "dominação do homem pelo homem"; é o razoamento [raciocínio] marxista e burguês do nascimento de uma sociedade de classe como "pré-condição" à emancipação humana.


Desafortunadamente a asa libertária do socialismo -- os anarquistas -- não avançaram consistentemente na prevalência do moralista sobre o econômico. Embora quiçá o desenvolveram a partir do nascimento do sistema fabril, locus classicus de exploração capitalista, e de, nascimento do proletariado industrial como "capa" da nova sociedade.


Com todo o seu fervor moral, a adaptação sindical à sociedade industrial e a imagem do sindicalismo libertário como infraestrutura do mundo liberado, supôs uma mudança apreciável na ênfase intencional do comunitarismo face o industrialismo; de valores comunais a valores fabris [1].


Alguns trabalhos que adquiriram santidade doxográfica [designa uma coleção de escritos de um determinado autor, citados, mencionados ou resumidos por autores posteriores.] dentro do sindicalismo, serviram para enaltecer o significado da fábrica e, de forma mais geral, o lugar do trabalho dentro da teoria radical, e isso por não falar do papel messiânico do "proletariado".


Os limites desta análise não necessitam ser igualmente analisados neste artigo. Em forma superficial, parece-me que estão justificados com os fatos acontecidos na época da Primeira Guerra Mundial e os anos 30.


Hoje em dia a situação é distitna, e o fato de que podamos criticá-los com a sofisticação que nos dá a perspectiva de décadas, não nos dá direito a patrocinar o descrédito do socialismo proletário pela sua falta de visão futura.


Porém deve fazer-se a matização: a fábrica e, com a história, o lugar de trabalho, foi o lugar principal não só da exploração, senão também de hierarquias, a isto há que adicionar a família patriarcal.


A fábrica não serviu precisamente para "disciplinar", "unir" e "organizar" o proletariado capacitando-o para a mudança revolucionária, senão para escravizá-lo nos hábitos da subordinação, a obediência e a penosa robotização descerebrada.


O proletariado, assim como que todos os sectores oprimidos da sociedade, volta à vida quando se despoja dos seus hábitos industriais e entra na atividade livre e espontânea de comunizar, isto é, o processo vital que dá significado à palabra "comunidade".


Então os trabalhadores despojam-se da sua natureza estrita de classe, que não é senão a contrapartida do estatus de burguesia, e revela-se a sua natureza humana.


A ideia anárquica de comunidades descentralizadas, colectivamente gestionadas, estaduais, e com uma democracia direta e a idéia da confederação de municipalidades ou "comunas", fala por si só.


Assim como numa formulação mais expressa através dos trabalhos de Proudhon e Kropotkine, expressando o papel transformador do municipalismo libertário como uma coluna vertebral de uma sociedade liberadora, enraizada no princípio ético anti-hierárquico de unidade da diversidade, autoformação e autogestão, complementaridade e apoio mútuo.


nota:

[1] Como exemplo particularmente deprimente, só há que ler El organismo económico de la Revolución (Barcelona, 1936), traduzido ao inglês como "After the revolution", dito trabalho influência enormemente à CNT-FAI.

in:

http://www.galizalivre.org/?q=ensaio/teses-sobre-municipalismo-libert-rio

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